"Tudo é feito para conexão absoluta, a mais saturada possível"

"Diria assim, para começar, que se vive hoje uma espécie de saturação em todos os sentidos: de imagens, palavras, sons, estímulos e excitação. Há uma espécie de mobilização total de todos os sentidos o tempo inteiro. Esse “turbocapitalismo” precisa disso: mobilizar o corpo, os sentidos, capturar a atenção, preencher ao máximo os espaços mentais – e isso, de algum modo, comanda. Quer dizer, não é gratuito, é um certo modo de controle, de plugagem, de monitoramento, de direcionamento. Talvez o mais difícil, praticamente impossível, seja se desplugar, desconectar-se. Hoje, tudo é feito para conexão absoluta, a mais saturada possível".


E esse modelo de conexão absoluta termina por redefinir a forma como as pessoas convivem, não?
Gera, digamos, um automatismo da resposta. Assim como somos levados a responder imediatamente a um e-mail ou a uma comunicação qualquer, imagina-se uma imediatez necessária nessa intersubjetividade. De fato, quando alguém se despluga, fica em silêncio, não responde às expectativas, gera um desconforto, um estranhamento, um desassossego, uma perturbação. Não só na comunicação se dá essa perturbação generalizada. Eu veria isso, numa primeira abordagem mais genérica, em todos os domínios. Essa poluição é um modo novo de controle. Tudo isso que está posto é uma certa política, uma certa economia, uma nova modalidade de produção subjetiva. Claro que, se descermos um pouco mais no detalhe, não podemos tomar isso como uma totalidade dada. Por quê? Por toda parte acontecem outras coisas também... Acontecem os n escapes, as n conexões, as pequenas estratégias de criar...

Existem, portanto, a necessidade e as tentativas de escapar a tudo isso.
Deleuze,  o filósofo que acompanho faz tempo, dizia que nós somos atravessados a tal ponto de palavras inúteis, que é preciso criar vacúolos de silêncio para poder ter algo a dizer. Então, essa maneira de criar silêncios para que possam surgir coisas não previstas, não formatadas previamente, é o que alguns artistas, alguns criadores, mas também alguns experimentos coletivos, tentam sustentar hoje. Tentam produzir outro ritmo, outra respiração, outros vazios, outros silêncios para que algo possa fazer sentido novamente. O que acontece nesse excesso, nesse bombardeio generalizado, nessa saturação, é que tudo e nada são a mesma coisa. Perde-se, assim, capacidade de produção de sentido. Com essa quantidade, esse tsunami de informações, ninguém é capaz de apreender, elaborar, digerir, selecionar, ou mesmo recusar.
Uma última pergunta: diante de tudo que discutimos, qual seria o maior desafio – individual e coletivo?
Inventar dispositivos de interrupção. Surge-me a imagem de freios de emergência de trem. Acontece que, com essa freagem brusca, às vezes podem acontecer descarrilamentos. Que, muitas vezes, são e serão necessários.

Entrevista com Peter Pál Pelbart publicada originalmente na revista Continente, 30.03.2016



Comentários

Postagens mais visitadas